“O segundo semestre deste ano promete trazer boas novas para a economia"
Vanessa Valério Gullo, diretora financeira da Embraplan Engenharia, fala sobre igualdade de oportunidades, gestão, inovação e liderança.
Por DANIEL ROCHA
Cada vez mais, as mulheres têm ocupado cargos de gestão e demonstrado o seu incrível talento frente às adversidades do mundo empresarial. Vanessa Valério Gullo se encontra neste grupo que a cada dia mais alcança patamares que em outros tempos seriam impensáveis.
Diretora financeira da Embraplan Engenharia (construtora fundada por seu pai, Antonio Valério, há mais de vinte anos, na cidade de São Paulo, e que já entregou, neste período de franca atividade, mais de cinco mil apartamentos, não só na capital paulista, mas também em Osasco, Cotia e Piracicaba), ela pôde vivenciar, após um longo caminho, de muito aprendizado, experiências profissionais diversas, nos mais diferentes departamentos da companhia, o que a fez adquirir muito conhecimento e se apaixonar pela área de gestão. Formada em Administração, casada e mãe de dois filhos, ela ingressou na empresa quando do lançamento do edifício comercial de alto padrão “Splendor Office”, primeiro projeto promovido pela organização no interior paulista, em 2011.
À Trinova, ela falou não só sobre como conciliar a vida pessoal e profissional e o quanto isto pode ser custoso às mulheres, mas também sobre o seu perfil administrativo, bem como, tratou das mudanças trazidas pela pandemia do Novo Coronavírus a função de gestor, da importância da realização de trabalhos sociais e do que ela espera para o Brasil e o mundo para o pós-Covid-19. Confira a seguir:
TRINOVA — Como você descreveria o seu perfil de gestão?
VANESSA — Sigo o modelo de gestão 4.0, onde o foco é criar um ambiente onde todo mundo é responsável pelo sucesso do negócio e cabe as equipes a forma como as tarefas serão realizadas, tirando a verticalidade do sistema de comando. Na prática, criamos as políticas e diretrizes da empresa para o ano vigente e, a partir daí, criamos os objetivos, as metas e os indicadores de medição. Tudo isso é feito de forma conjunta para que os grupos de trabalho se sintam realmente seguros em cumprir com as ações propostas. Os indicadores são acompanhados, mensalmente, por todos os gestores. Essa metodologia dá aos colaboradores uma maior autonomia e os fazem se sentir mais estimulados para sugerir melhorias nos processos.
TRINOVA— Qual foi o seu maior aprendizado como diretora financeira da Embraplan até agora?
VANESSA — Foi quando eu comecei a entender melhor como funciona cada departamento. Um diretor financeiro não pode mais ficar fechado em sua sala, focado somente em números e relatórios, pois, atualmente, as finanças têm ganhado um perfil cada vez mais comunicativo e disposto a colaborar com todos os setores de uma empresa, participando da criação de produtos que estejam alinhados com as tendências de mercado, com a análise dos custos totais e com a definição de metas realizáveis e mais lucrativas. A figura que eu tinha da diretora financeira que passava o dia inteiro calculando, deu lugar a uma executiva com visão de negócio, estratégia e olhar para o futuro.
TRINOVA — Quais foram as mudanças mais significativas impetradas pela pandemia de Covid-19 à sua gestão?
VANESSA — O mundo todo foi surpreendido com esta pandemia, que implicou em uma redução brusca no ritmo de produção de todos os setores da economia global. O primeiro passo foi olhar para dentro da companhia e rever os planejamentos para o ano de 2020. O maior desafio foi manter toda a equipe trabalhando sem perder a produtividade e a segurança. Com o passar dos meses, sentimos que, mesmo com a pandemia, a demanda por novos imóveis estava aumentando, então, mantivemos o ritmo das obras e o lançamento que nós tínhamos previsto para o ano. Antes da pandemia, a Embraplan já começava a articular a busca por novos sistemas e processos que fossem capazes de proporcionar mais agilidade, produtividade e qualidade. Com a chegada dela, aceleramos a implantação desses procedimentos. Um exemplo foram as vendas dos apartamentos de forma digital. Na atualidade, conseguimos realizar a entrega de um imóvel com processo 100% eletrônico, de forma rápida e segura, desde a escolha das unidades até a lavratura da escritura.
TRINOVA — Quais são as maiores dificuldades encontradas pelas mulheres no caminho rumo à ocupação de um cargo de gestão e o que pode ser feito para que estas sejam mitigadas?
VANESSA — A maior dificuldade, infelizmente, ainda, é o preconceito. Percebo que existe discriminação até por parte de outras mulheres. O fato é que o avanço delas rumo a cargos de comando é bastante lento, mas, está acontecendo. Há algumas décadas, seria impensável mulheres trabalhando em cargos de liderança em diversas profissões, simplesmente, pelo fato de serem mulheres. A concepção social era de que elas não estavam no mesmo nível intelectual dos homens ou de que o papel a que se destinavam era apenas o de mãe e cuidadora do lar. O que pode ser feito? Não existe segredo. Um profissional, seja ele homem ou mulher, deve ser avaliado pelas suas competências, pelo cumprimento de metas e pelo desenvolvimento bem-sucedido de um trabalho. Se cumprir esses requisitos, o cargo de gerência vem por consequência.
TRINOVA — Uma vez ocupando o cargo, quais são os principais desafios que as mulheres encontram para conciliar família e profissão e o que elas devem fazer para superar tais dificuldades?
VANESSA — Acredito que o maior desafio é manter a “balança” equilibrada. Para isso, é essencial um bom planejamento semanal. Seguir uma rotina ajuda muito na organização do meu dia a dia. Os meus colaboradores sabem os horários em que me encontrarão na empresa e a minha família sabe dos horários que estarei em casa. Apesar do planejamento, tem dias que a gente acaba precisando ser mais mãe, outros “mais trabalho”, e o desafio é a gente não se cobrar tanto por isso. É fazer tudo com a certeza de que estamos realizando o melhor que podemos para aquele momento. A qualidade do tempo que passamos exercendo cada uma dessas funções conta mais do que a quantidade deste destinada para executá-las. O que é preciso é estar focada na atividade que se está fazendo em um determinado momento. Isso sim faz que nos sintamos realmente em paz. A culpa que uma mulher que trabalha demais pode carregar, por não ter sido uma mãe melhor, por exemplo, pode ser reduzida com a qualidade do tempo que ela passa com os seus filhos. A seriedade com que trato o meu tempo de trabalho é a mesma em relação a quando estou com os meus filhos ou em um momento de lazer com a minha família.
TRINOVA — Como a Embraplan tem trabalhado a questão da igualdade dentro da empresa, não só de gênero e racial, mas de quaisquer outras ordens?
VANESSA — A Embraplan traz com ela valores de igualdade, humildade, equidade, valorização do trabalho e princípios de meritocracia. Nós buscamos, realmente, incluir as pessoas, debater e trabalhar para que todos sejam ouvidos e tenham oportunidades iguais de crescimento e sucesso e sem favoritismo. Simplesmente, pela competência. Temos vários meios de comunicação direta com a alta direção para o recebimento de feedbacks, informações, sugestões de melhoria ou denúncias por parte de todos os colaboradores. Disponibilizamos treinamentos para todos os cargos. Na Embraplan, a construção de um ambiente acolhedor e de igualdade é diária.
TRINOVA — Atualmente, você desenvolve atividades de natureza social junto à entidade “Lar Franciscano”, de Piracicaba, que acolhe crianças e adolescentes em estado de vulnerabilidade social. De que modo se dá a sua participação e qual é a importância de as pessoas em geral se envolverem com projetos nesta esfera?
VANESSA — Meu envolvimento em atividades sociais é algo que já vem de família. Meu pai é de origem muito humilde e sempre cultivou a generosidade e a compaixão ao próximo dentro de nossa casa. Quando comecei a atuar com entidades sociais, senti que evoluí como ser humano, pois lá dentro convivemos com problemas reais, o que me fez questionar o meu modo de viver e pensar e passei a agradecer por cada minuto da minha vida. Ajudando ao próximo consegui sentir uma felicidade plena, uma sensação de reciprocidade em relação a Deus por tudo o que possuo hoje. Minha escolha por uma entidade que lida com crianças e adolescentes não é por acaso. A maternidade trouxe comigo uma transformação no modo de olhar para as crianças e de agir com elas. É muito revoltante e doloroso vê-las convivendo com toda a crueldade existente no mundo, então, procuro fazer algo. Minha participação acontece no nível de gestão administrativa, procurando manter a equipe motivada e buscando trabalhar com um orçamento bastante enxuto.
TRINOVA — O que é preciso para que uma companhia continue sempre crescendo, se renovando e entendendo o mercado em que atua, a fim de não perder espaço para a concorrência ou, até mesmo, vir a fechar?
VANESSA — É preciso que a alta gerência se volte para a inovação. Parece clichê, porém, vejo muitos empresários focados somente em seu fluxo de caixa e avaliando apenas o retorno do capital. Eu acredito que, hoje, 70% do tempo dos diretores deveriam estar voltados para a capacidade da empresa em inovar perante a concorrência, pois elas estão sendo vistas com maior valor quando as pessoas enxergam o seu potencial de crescimento no futuro. Ao fazer o que ninguém faz, a sua companhia chama para si a atenção necessária para se destacar em relação às demais. As minhas dicas são: entenda bem o mercado, segmentos, clientes e necessidades; acompanhe seus concorrentes e entenda o potencial de novos entrantes; entenda as mais recentes tecnologias que afetam o seu negócio; vá à feiras e eventos; busque cursos de atualizações; e estimule sua equipe a buscar por tudo isso também. Faça isso constantemente.
TRINOVA — O que esperar do Brasil (e do mundo) para este e para o próximo ano?
VANESSA — Economicamente, os países estão se recuperando, com a retomada das atividades após o tombo de 2020, ocorrido em virtude da pandemia, porém, em um ambiente incerto e ainda muito dependente de vacinas, fica difícil prever muitas coisas. No Brasil, de acordo com as estimativas de grandes bancos, o segundo semestre de 2021 promete trazer boas novas para a economia. A questão fiscal e política é que me preocupa muito, ainda que exista uma variação positiva prevista para a indústria, a agropecuária e os serviços. A projeção é de alta de 4% para o PIB (Produto Interno Bruto) da construção civil, beneficiado pelo baixo nível das taxas de juros no país, que apesar de estarem subindo, ainda se encontram em um nível bastante diminuto em termos históricos. Além disso, a inflação está controlada. Por essas e outras, apesar das dificuldades, estou bastante otimista.